terça-feira, 22 de março de 2011

"Guarda Noturno dos EUA"- Analistas veem pouco em comum nas falas de Obama em Brasil e Chile

No Rio, predominou clima descontraído; no Chile, foco foi América Latina.

Democracia e liberalismo foram temas abordados nos dois pronunciamentos.

Maria Angélica OliveiraDo G1, em São Paulo

O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, utilizou uma mesma frase - de efeito - nos discursos que fez no Brasil, no domingo (19), e no Chile, nesta segunda-feira (20).

Nos dois eventos, ele afirmou que não deve haver parceiros 'sênior' ou 'júnior' entre os países, mas sim parceiros iguais.

Democracia e liberalismo também foram referências constantes nas duas mensagens do presidente.

As semelhanças entre os dois pronunciamentos, no entanto, foram poucas.

No Rio, um Obama descontraído arriscou palavras em português, citou escritores e músicas e falou de futebol. Em Santiago do Chile, o lado emocional ficou por conta da referência ao resgate dos 33 mineiros, mas o foco foi a América Latina, política, comércio e o governo cubano.

O G1 ouviu dois cientistas políticos para saber os pontos em comum e as diferenças entre os dois pronunciamentos.

O cientista político Rafael Cortez, professor da PUC-SP e analista da Tendências Consultoria, diz que os discursos no Brasil tiveram relação direta com o peso das relações entre os dois países.

“No Brasil, foi um discurso mais próximo pra agenda das relações bilaterais. A agenda Brasil-EUA é muito mais rica e muito mais importante. Acho que, por isso, o Obama olha com mais cuidado a questão do Brasil. E, no Chile, foi um discurso mais fluido, não voltado para um país”, diz.

'Boa vontade'
Contra as críticas de que os pronunciamentos do presidente dos Estados Unidos foram superficiais no Brasil, Cortez afirma que as manifestações de Obama no Brasil penderam para a política de boa vizinhança como estratégia para esfriar ânimos com relação a temas delicados como a aproximação do Brasil com o regime iraniano, no governo Lula, a reivindicação brasileira por uma vaga permanente no Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU), a questão cambial e as disputas entre os dois países na Organização Mundial do Comércio (OMC).

“Acho que mostrou o cuidado em não mexer em questões mais delicadas que não se resolvem em discursos. Ele não tocou em pontos sensíveis justamente para esfriar ânimos mais acalorados e daí sim tentar uma agenda positiva. Os pronunciamentos aqui dão uma primeira sinalização de boa vontade. Não sei o quanto isso vai se traduzir posteriormente em ações, vai depender das negociações”, analisa.

'Guarda noturno'
Para Manoel Sanches, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a escolha do tema latino para o discurso do Chile foi uma estratégia para evitar que o Brasil, acusado de imperialista pelos vizinhos, carregue ainda mais a pecha. “Foi para evitar um sobrepeso para o Brasil, para que a América latina não visse o Brasil como um guarda noturno dos Estados Unidos”, opina.

Foi também um exemplo de como o Brasil ainda é visto de forma separada da América Latina.

“Como costumamos dizer, estamos de costas para a América Latina. A tentativa brasileira do Mercosul foi uma primeira mirada, para usar a expressão hispânica, para a América Latina. (...) No Brasil, em momento nenhum se referiu à América Latina, é como se o Brasil fosse um país da Ásia ou da Europa.”

Sanches notou ainda o uso de algumas palavras, que mostram a diferença entre os assuntos abordados. Ele comparou as vezes em que o presidente dos EUA usou as palavras latina, Cuba e drogas nos dois momentos. “No Chile, ele se refere 31 vezes à palavra latin, nove vezes a Cuba e sete vezes à palavra droga”. No discurso do Theatro Municipal, na capital fluminense, as palavras não foram mencionadas.

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